Gustavo Soares
Entrevista — 2020
MAPA DE CARACTERES
Gustavo Soares é especialista em tipografia e design da informação. Sua experiência com design de revistas revelou o interesse por arquitetura de informação e desenho tipográfico, ambos aprofundados em dois mestrados: Information Design, concedido pela University of Reading - Reino Unido; e Type and Media, realizado na Royal Academy of Arts (KABK).
Durante este período, Gustavo aprendeu a refletir sobre a prática, analisando o que funciona para definir fluxos eficazes de trabalho. Sua experiência encontrou terreno fértil em projetos grandes de sinalização temporária e permanente, como o trabalho realizado como líder de design e consultor externo para projetos como: Copa do Mundo FIFA 2014, Jogos Olímpicos Rio 2016, Jogos Pan-americanos Lima 2019, a Cidade Universitária da Fundação do Qatar e Aeroportos Internacionais no Brasil.
Além disso, Gustavo foi Membro do Júri em duas edições da Bienal Tipo Latinos (2014, 2016) e centenas de designers participaram de seus workshops no Brasil, México, Chile, Portugal e EUA. Ele é o fundador da Academia Tipográfica.
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Relíquias. Trabalho sobre o David Carson na ESPM. “Impossível de entender o que acontece...”
Como você descobriu o design? Poderia nos falar sobre o início de sua carreira?
Eu descobri o design no segundo ano da faculdade, na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), em São Paulo. Na ocasião, em um sorteio para um projeto sobre diretores de arte, eu acabei saindo com o David Carson. Eu não conhecia design, para ser bem sincero, nunca tinha ouvido falar de design. Eu queria na verdade ser diretor de arte. E aí, de repente, me deparei com o Carson. Foi um grande choque. Eu fiquei imediatamente apaixonado.
Existia uma coisa nas minhas soluções para os anúncios: ninguém entendia o que eu fazia, era sempre um anúncio que eu precisava explicar, então ele nunca funcionava. Se eu tivesse seguido como diretor de arte, certamente não seria bom em propaganda. Mas quando eu vi as coisas que o David Carson estava criando para o editorial, em revista, eu fiquei alucinado. Imagina: eu fazia anúncios de propaganda e ninguém entendia, quando eu olhei para suas criações pensei: “existe um cara que tem um emprego e faz essas coisas. Onde é possível?
Então eu passei os dois anos finais da faculdade estudando design de maneira informal, por interesse próprio. Na época, em 2003, a ESPM não tinha nada de conteúdo de design. Nesta altura, quando olhei as possibilidades que eu tinha para trabalhar com revista, percebi que existia o Curso Abril de Jornalismo, que é a porta de entrada da editora para jovens designers. Mas eu não passei na seleção. Foi então que eu olhei para a Miami AD School, que tinha acabado de chegar no Brasil. E lá tinha o Alceu Nunes, que na época era diretor de arte da Superinteressante. Ao avaliar aquele corpo de professores eu pensei: vou dar um jeito desse cara me contratar. Eu vou ser um aluno muito fora da curva e ele, por estar em certa posição, vai me contratar. Fui com isso muito claro na minha cabeça. Mas quando eu comecei fazer a Miami AD School, eu só fui ter aula com Alceu no terceiro ou quarto trimestre.
Eu passei aproximadamente nove meses estudando até ter a oportunidade de conhecê-lo. Mas este tempo me trouxe oportunidades incríveis. Foi neste período que eu conheci a Fernanda Martins, o Luciano Cardinali, o Bill Martinez, e foram estes professores que me ensinaram design de maneira estruturada.
Quando chegou a hora de ter aula com Alceu eu me esforcei bastante para realizar a disciplina e claramente chamar atenção dele. Deu certo. Naquela época, a Miami AD School tinha um modo de operação (eu não sei se ainda tem) onde o professor convidava dois profissionais do mercado para avaliação dos projetos finais. Para a minha avaliação foram convidados o Saulo Ribas e o Rodrigo Maroja - que hoje é um grande amigo. Naquela época, esses caras já eram super diretores de arte. Como o meu trabalho foi bem avaliado, alguns dias depois o Saulo Ribas me convidou para um projeto dentro do núcleo de edições especiais da Editora Abril.
Revista Bizz. Editora Abril
Com isso, veio o convite para dar vida a nova versão da revista Bizz. Criada inicialmente nos anos 80, a revista tinha como proposta ser uma Rolling Stone brasileira, ainda inexistente por aqui (só chegaria de forma oficial em 2006). Foi então que eu me deparei com a tarefa de criar o projeto gráfico para uma revista mensal com fluxo de leitura, com começo, meio e fim. Foi uma experiência fabulosa. Neste projeto tive muito contato com o Alceu Nunes, sendo ele diretor de arte de várias publicações da editora. Durante este curto período eu aprendi muito sobre design em várias frentes, como composição tipográfica, fotografia, ilustração, produtividade, gestão de arquivos e conteúdo. Era uma equipe pequena de quatro pessoas, dois na arte, dois no texto. Foram oito meses de aprendizado.
Com sua passagem por empresas de comunicação e escritórios como Abril, dooType, Tátil Design e ICON, percebemos que sua trajetória permeia projetos conectados com o type e o design da informação. Como construiu sua atuação com o design da informação e a sinalização? Isso tem relação com a tipografia?
Eu não vejo que foi a tipografia, especificamente, que me atraiu ou que me conectou a esses escritórios ou projetos. Na verdade, eu me sinto muito atraído por projetos que tem algumas características, dentre elas: projetos que tem um grande volume de informação, que tem oportunidades para macro e micro tipografia, com possibilidade para o desenvolvimento de uma linguagem gráfica, com experiência de uso e arquitetura de informação. Curiosamente, eu só fui ter maior clareza sobre esses aspectos quando fiz um mestrado na universidade de Reading, na Inglaterra. Ali, tive oportunidade de me envolver com um projeto de sinalização com certa envergadura teórica e avaliação de profissionais do mercado. Fiquei muito interessado em sinalização por encontrar todos esses aspectos que me atraem. Além disso, existe um senso de serviço público muito forte. São projetos que tem um impacto imediato nas pessoas. Então eu percebi que isso é algo que me interessa demais.
Foi neste período (2006-7) que conheci o mestrado da Royal Academy of Art (KABK), na Holanda. E neste momento, eu fui estudar desenho tipográfico com o interesse em sistemas de sinalização, algo que eu continuei pesquisando. Então hoje, quando eu olho para trás e vejo todos esses escritórios por onde passei, pelas empresas por onde passei, vejo claramente que eu estava na verdade procurando projetos com um terreno fértil para o desenvolvimento dessas habilidades. É claro que na época eu não tinha essa clareza, mas hoje, a partir dessa pergunta, eu percebo que são esses projetos que me atraem: projetos com esse conjunto de características, não necessariamente, projetos que tem a tipografia como um denominador comum.
The Type Season. Uma tentativa de capturar em imagens a experiência do mestrado na Holanda
Você participou de projetos de sinalização para alguns aeroportos e cidades, como a Rio a Pé. Poderia citar em quais esteve envolvido e os principais desafios encontrados?
O primeiro projeto profissional que tive oportunidade de participar foi para o grupo EBX, durante o período em que estava trabalhando na Tátil Design. Na verdade, foi mais um exemplo sobre procurar oportunidades por projeto e não por empresa. Quando eu me mudei para o Rio de Janeiro eu fui mostrar o meu portfólio lá, e eles, na verdade, mostraram interesse em me convidar para fazer parte da equipe desse projeto específico. Na época, Eike Batista estava na crista da onda, com negócios em todas as áreas como mineração, petróleo, logística... muitas empresas. Era então um projeto de sinalização de grande alcance, mas que ficou apenas no escritório comercial, no Rio, e também em um petroleiro.
Com isso veio a oportunidade para trabalhar na Copa do Mundo FIFA 2014, entregar duas consultorias para o Comitê Rio 2016 e depois em um grande projeto, que é o Rio a Pé. Este é o sistema de sinalização turística para pedestres da Cidade do Rio de Janeiro, feito a quatro mãos com a Applied Wayfinding, uma das principais consultorias de sinalização para cidades do mundo. Acredito ser ainda hoje o sistema de sinalização mais completo que existe no Brasil. Ele foi um divisor de águas: o meu entendimento sobre sinalização e sistemas de orientação passou a ser outro.
Sinalização para o Rio de Janeiro. Copa do Mundo FIFA 2014: metrô, aeroporto, porto, praias e arredores do Maracanã no escopo
Então vieram outros convite, outras oportunidades. Acredito que com isso encontrei bastante confiança para realizar e vender este serviço, para projetos dessa natureza. Consegui participar de três projetos com escritório Paulista PS2. Colaborei com eles no aeroporto de Florianópolis, no aeroporto de Porto Alegre e no aeroporto de Fortaleza. Ajudando posteriormente, através da prestação de serviço de fluxos de produtividade automação, a equipe da Hardy Design (Belo Horizonte) a fazer a sinalização de um hospital da Unimed.
Talvez o principal desafio em sinalização seja a escala, de tudo. São áreas grandes, peças grandes, geralmente alguns clientes e vários stakeholders, muita instrução, reuniões, placas, materiais, mapas, artes finais, manuais, instalações, e por aí vai. São projetos de meses ou anos. Eu me sinto atraído por esses cenários porque sem processos, inteligência e tecnologia o sofrimento é garantido. A gente precisa poder viver a nossa paixão, dar nossa contribuição sem abrir mão da vida para isso.
Sinalização para o Aeroporto International de Florianópolis. Projeto e execução do escritório paulista PS2, “turbinado por uma solução de automação bombástica”
Rio a pé - Walk Rio. Um dos projetos mais completos de sinalização para pedestres do país e da América Latina. O projeto foi feito a quatro mãos com o escritório inglês Applied Wayfinding. “É um divisor de águas na minha carreira”.
Você teve oportunidade de trabalhar com o escritório australiano Dotdash.
Sim, em 2016. Lá eu tive uma participação muito rápida. Na verdade, eu passei em uma seleção que eles realizaram. Fiquei um mês e meio. Foi algo sobre ter uma experiência, mas não deu certo, então é algo que eu também não falo muito. Este foi o único escritório dedicado a sinalização que eu tive a oportunidade de trabalhar. Foi neste ambiente que vi alguns dos profissionais de mais alto gabarito trabalhando no mesmo espaço. Eram uns seis ou sete designers, todos bem qualificados. Eu lembro de algumas das reuniões de projeto e eles tinham algo entre 20 ou 30 projetos de sinalização caminhando em paralelo, ao mesmo tempo.
Em que momento surgiu a ideia para montar a Academia Tipográfica?
A Academia Tipográfica (academiatipografica.com) nasce de alguns fatores indiretos e outros mais diretos. Desde a faculdade tive muito respeito e muito apreço pelos professores. Eu sempre reconheci o privilégio de poder estudar no colégio em que eu estudei, na faculdade em que eu estudei, fazer os mestrados que eu fiz... Eu sempre fui muito grato e essa gratidão se manifesta e se manifestou em querer ensinar. De poder compartilhar esses conhecimentos. Acho que eu sempre tive uma imagem da figura do professor, da figura que eu admiro. Tanto que eu tinha isso no meu imaginário: “ser professor, que coisa incrível”.
A Academia Tipográfica começou com workshops pela dooType e aos poucos foi ganhando força própria. Depois de dois anos, a operação no Brasil migrou para o online, mas segue com workshops presenciais no exterior (Chile, México, EUA e Portugal)
Então eu fui agraciado com essa oportunidade. Dei aula no IESB (Instituto de Educação Superior de Brasília), depois em Recife, na Faculdade de Boa Viagem, na PUC no Rio, entre outras. Mas na verdade, toda essa experiência não foi tão satisfatória assim. Eu fiquei muito frustrado em muitos casos. Eu tinha uma vontade de seguir compartilhando conhecimento, mas não dentro desse modelo clássico. Tenho minhas críticas, sobre o qual, acredito, o modelo online tem potencial para resolver.
De maneira mais direta eu poderia apontar que entre 2016 e 2017, quando eu tinha acabado de sair do projeto Rio a Pé, eu quis começar a vender esse serviços para alguns escritórios de design, como serviços de fluxo de automação e produtividade. Mas eu notei que, apesar de ter conseguido fechar alguns projetos, a maioria dos donos dos escritórios não estava tão interessada nessas soluções. E este período foi muito difícil financeiramente para mim. Até que chegou um ponto em que eu parei e pensei: eu preciso de liquidez. O que eu tenho para não ter que esperar três meses para um pagamento? E a conclusão foi conhecimento. Eu sentia que eu tinha muito conhecimento para passar, um conhecimento muito específico que eu não encontrava no Brasil. Com isso vieram os workshops presenciais e esse piloto cresceu em escala até alcançar o ambiente digital. Eu acho que vale a pena comentar aqui, saindo um pouco da pergunta, que eu tive que vencer muitas barreiras de pensamento sobre limitações quando eu comecei a me envolver com essa coisa do marketing digital. Ali existem muitas questões difíceis de digerir. São coisas que envolvem muita malandragem, e eu não me sinto bem em vários desses aspectos.
Stone Carving. Projeto para aula da mestra Françoise Berserik, na KABK
Houve um momento de dúvidas sobre o modelo de negócio?
Em certo momento. Após uma imersão de negócios de três dias em um centro de convenções com quatro mil pessoas (pensando muitas vezes em me levantar e ir embora), eu elaborei completamente A Academia Tipográfica. E eu percebi que eu não conseguiria colocar ela para andar sozinho. Então eu precisei fazer um movimento, um investimento que nunca imaginei fazer, em alguém que poderia me ajudar a dar esses passos. Foi com o processo de mentoria que surgiu a orientação sobre montar uma equipe, sobre contratar um especialista em tráfego, que também era algo que, sinceramente, nunca passou pela minha cabeça e eu nunca me vi fazendo esse tipo de investimento. Na minha cabeça isso era jogar dinheiro fora. Mas fez toda a diferença do mundo. Em um ano, eu não só recuperei o investimento como eu tive uma lucratividade muito interessante, para uma empresa de um ano.
Em 2012, você foi consultor do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos da Rio 2016. Como surgiu o convite e como se deu sua participação neste projeto?
A minha esposa trabalhava em um escritório de design carioca que se chama Dupla Design, onde os sócios foram gerentes no Comitê Rio 2016. Então, antes mesmo deles serem convidados para assumir, eu já os conhecia por ter colaborado em outros projetos. O escritório identificou ali claramente duas oportunidades para minha colaboração: uma através de uma espécie de sensibilização e educação para a equipe de sinalização, e o outro para o projeto de criação da tipografia proprietária dos jogos.
Ambos ocorreram de maneira super suave. Para a sinalização, eu caminhei de maneira muito autônoma. Trabalhei como consultor na produção de relatórios que olhavam para as edições de jogos olímpicos. Especificamente, para as que apresentavam projetos de sinalização de grande envergadura. Olhamos para México, Munique, Atenas, Vancouver, que foi o único de inverno, mas com uma resposta maravilhosa, e claro, Londres 2012. Eu fiz uma análise bem científica, estabelecendo parâmetros de avaliação, produzindo um relatório para cada uma das edições dos jogos olímpicos e um relatório final condensando tudo com macro recomendações. Este seria o documento utilizado pela equipe que trabalharia na Rio 2016. Como parte desse projeto fiz também uma série de recomendações de customização para a família tipográfica TheSans, do Lucas de Groot, que foi usada na comunicação corporativa dos jogos e também na sinalização.
Medalha recebida do Comitê Rio 2016 em reconhecimento aos serviços prestados para os jogos
Você esteve envolvido então com o projeto da fonte proprietária das Olimpíadas de 2016? Teve oportunidade de se envolver na seleção final?
Eu inicialmente fui convidado para ajudá-los a mapear o mercado brasileiro, por que eles queriam que fosse um type designer brasileiro. Em seguida, para ajudá-los a confeccionar o briefing, que seria utilizado como ponto de partida. Não era algo simples por envolver algumas questões sobre tridimensionalidade, com conceitos e valores que precisavam ser traduzidos de forma mais tipográfica. E foi exatamente isso que eu fiz. Mas eu não participei da seleção. Além do mapeamento do mercado, eu dei recomendações sobre quais empresas e profissionais seriam os mais adequados e porquê. Com isso pronto, realizaram um processo interno de decisão.
Nos últimos meses, a situação promovida pela pandemia impôs novas questões sobre nossas rotinas pessoais e de trabalho. O estabelecimento de um possível modelo apresentado como "novo normal" tem sido fruto de muitas falas e críticas. O que este cenário pôde ou pode realmente nos ensinar?
Eu identifico três pontos que ficaram ou são bem marcantes. O primeiro é que o trabalho remoto é possível. Nesse caso, eu tenho esta característica de trabalhar remotamente. Eu gosto de ter meu espaço. Eu não sou um cara que gosta de ir trabalhar em espaço compartilhado, de alugar uma sala, de agência, empresa e afins. Curto trabalhar em um quarto dentro de casa onde eu me sinto totalmente confortável. Eu não tenho problema de foco, atenção. Nada. Acho incrível poder fazer uma pausa, tomar um café com a família, voltar, as crianças entram, saem. Na pandemia tem sido mais desafiador, mas é uma coisa que eu gosto bastante.
Eu já trabalhava com alguns clientes que não acreditavam no trabalho remoto, principalmente em projetos de sinalização. Para dar um exemplo concreto sobre isso, eu poderia falar da minha experiência com o escritório inglês, CSM Live, que tem uma postura muito “pé atrás” com essa coisa de trabalho remoto. Hoje, enquanto converso contigo, estamos desenvolvendo uma consultoria para Fundação Qatar, com quatro profissionais alocados: uma diretora da Austrália, outra na Inglaterra, o líder do projeto e diretor do escritório, no Qatar, e eu aqui, no Brasil. E o trabalho está sendo desenvolvido sem grandes problemas. A empresa está bem satisfeita com as entregas e com o nível do trabalho. Talvez a questão do fuso, pra gente, seja desconfortável.
O segundo ponto é que não é possível não ter uma estratégia digital para quem quer vender produtos ou serviços. Assim, é absolutamente excludente não ter isso resolvido e a pandemia está falando que você não vai conseguir, ou você vai ter muita dificuldade sem essa estratégia. E eu não estou falando de publicidade, sobre anunciar na rede social. Acho que esta estratégia digital exige mais e aquilo que é superficial, não funciona. Ela exige engajamento, conteúdo e comunicação mais sólidas.
E por fim, a questão de poder e privilégio. Esta é uma discussão de uma ordem mais complexa e sobre a qual realmente não é fácil falar, embora necessária. São muitos pontos de vista que a pandemia trouxe para nos sensibilizar, para reconhecer nosso lugar de privilégio, como o meu, com uma formação acadêmica, questões de saúde, família… tudo. São questões que revelam que não podemos avaliar alguns cenários tomando apenas um ponto como base. Isso não deveria acontecer. Não é possível.
Primeiro projeto na marcenaria. Orientações de Steve Ramsey, The Weekend Woodworker
Além do design, que outras atividades são do seu interesse?
Eu gosto muito de marcenaria. É uma paixão antiga, que eu achei que não brincaria até que meus filhos tivessem, vinte, vinte e poucos anos. Mas, neste contexto atual, a pandemia acelerou esse processo. Nesses 6, 7 meses em casa eu tomei a iniciativa de comprar alguma serras, construir uma bancada e realizar alguns projetos. É uma paixão. Eu acho muito bacana quando a gente vai aprender uma coisa nova, quantos paralelos encontramos com aquilo que somos mais fluente. A marcenaria me traz reflexões incríveis sobre o design. É muito legal.
Por fim: que conselho você daria a você mesmo no início de sua carreira?
Talvez seja o que eu tenho para dizer ainda hoje: seja gentil, não seja arrogante. Quando tive oportunidade de trabalhar com certos profissionais, consegui entender o que era isso. No início, quando trabalhei com Alceu Nunes, na Editora Abril, ele era diretor de arte de, não sei, umas 6 ou 7 revistas e publicações mensais com projetos gráficos complexos, com uma equipe para cada. E sabe, ele conseguia dar atenção para todo mundo. Era algo diferente. Eu acho que essa questão de gentileza, de atenção, faz com que a pessoa que está ali do teu lado tenha o seu melhor despertado. É algo sobre a minha condição de melhorar o ambiente, de influenciar o ambiente de tal forma que aquela pessoa ou equipe vai produzir de acordo com o melhor dela. Depois que eu tive mais clareza sobre isso, tento realizar isso dentro dos meus projetos, com a minha equipe. Este é um conselho que eu dou para mim ainda hoje, pois sigo tosco e grosseiro em vários níveis. Que a gente seja gentil.